
De repente eu ergui a cabeça e fiquei maravilhado com uma belíssima pintura que à minha frente se projetara. Meus olhos brilharam, uma vontade de posse me desceu narinas abaixo, mas logo me dei conta de que não tinha dinheiro comprá-lo. Cheguei a dar de presente uma espécie de gravura, de custo muito modesto, à namoradinha de então. Muito tempo depois, ao rever a gravura que dera de presente, senti vergonha da singeleza da oferta que fizera.
Foi quando me passou pela cabeça a ideia de aprender a pintar. Engasguei a vontade até o dia em que me surgiu uma oportunidade; e só pensei em exposição muitos anos depois, quando me senti confortável para expor o que estava produzindo. Era como se eu estivesse exigindo bem mais de mim. Antes da primeira exposição, da qual eu me lembro como se fosse hoje, tive que degustar alguns constrangimentos.
Incômodos, há muito tempo atravessados na garganta, levaram-me a enxergar na literatura um meio discreto de chorar alguns traumas às escondidas. Assim que a leitura se me debruçou na mente, identifiquei-me com um escritor libanês de nome Khalil Gibran e fiz dele a minha fonte de inspiração. Fonte da qual até hoje ainda bebo.
Anos à frente eu havia me tornado Sargento do Exército, Jornalista e progredido bastante nas habilidades literárias. Percebi que dispunha de uma história interessante para contar e, com isso, ajudar pessoas que tivessem que percorrer as mesmas trilhas que eu percorrera.
Depois de vários ensaios, estava eu com um romance choroso escrito, mas logo descobri que ninguém se interessaria pela leitura de um livro tão extenso de um escritor desconhecido. Então, como se voltasse a lidar com as velhas cartinhas de amor, dediquei inúmeras horas da vida a escrever crônicas, através das quais fui premiado em alguns concursos literários, dei uma popularizada na nova habilidade e fui ficando conhecido como escritor.
Publiquei um livro de crônicas, dentre as quais algumas premiadas e, só então, publiquei o meu primeiro romance. Tomei gosto pela arte das letras e estou no quinto livro solo, partícipe de algumas antologias, coletâneas e três projetos bem encaminhados.
Por conta do amor à literatura, optei pelo jornalismo ao concluir o ensino médio, apesar de uma gagueira chata que me perseguia desde a infância. Muitos riram de mim, ao saber do meu projeto acadêmico. Pretendia explorar o lado escrito do jornalismo, temendo os danos que a desgraçada da gagueira poderia me impor, mas ninguém estava interessado em saber disso.
No andar da carruagem, conheci alguns recursos técnicos como aulas de laboratório e técnicas de impostação, que me ajudaram muito a minimizar tal deficiência. Cheguei a ser repórter de televisão e convidado a migrar, simultaneamente, para duas emissoras. Dei-me ao luxo de recusar as duas ofertas por motivos familiares, principalmente, mudei de cidade, desempenhei as funções de comentarista esportivo, apresentador de musicais em radiodifusão na nova morada etc.
Essas atividades me levaram a lidar intensamente com a oratória, tanto nos meios de comunicação de massa, como nas instituições por onde passei. E foi aí que se deu o milagre “do esquecimento da gagueira”, pois, como Sargento, eu tive que dar aulas para cabos, soldados, novos sargentos… E tudo à base de “cumprir a missão”. Coisas assim: “O assunto é este e os seus instruendos são aqueles. Vá lá e resolva…! Se vira!”
Santo remédio…! Nem sei, exatamente, quando foi que esqueci que era gago.
Posteriormente, como integrante de grupos literários, inclusive uma academia de letras, licenciado em língua portuguesa para os níveis fundamental e médio e integrante de uma sociedade filantrópica, inclusive como presidente, fui obrigado a aperfeiçoar a arte de falar em público, ou seja, de palestrar. Parece-me, hoje, que eu estava me preparando inconscientemente. Parecia “estar escrito nas estrelas”.
No início da primeira onda de corona vírus, como por obra do acaso, assisti a um comercial de televisão que me fez “levantar as orelhas” para os tempos de quartel, televisão, rádio, aulas, instruções palestras à moda antiga…
Fiz uma comparação, percebi que estava defasado e resolvi acompanhar várias lives e comprar um curso de palestras junto a uma empresa “X”. Como também percebi um ligeiro retrocesso na oratória (um namoro com a gagueira), investi num curso de gravação de vídeos numa empresa “Y”… E meti a cara!
Um ano depois, batalhando nos dois cursos, eu havia formatado uma palestra moderna tendo a minha própria história de vida como pano de fundo e recuperado muito da intimidade com um microfone. Restava-me vencer a deficiência na esfera comercial, por reconhecer-me um péssimo vendedor. Viera à tona a mesma dificuldade com a qual eu tanto sofrera como artista plástico, motivo pelo qual era a minha esposa quem comercializava os meus quadros.
Aí, meu amigo, lá estava eu vasculhando as redes sociais e, diga aí quem apareceu… Um cara chamado Lucas Lopes, co-fundador e presidente de uma empresa de palestrantes, de nome Motiveação Palestras, que se tornou um amigo e incentivador.
Pronto: o resto da história a vida ainda vai escrever.
Silvio Cayua
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