Gosto de silêncio, de sensação de liberdade, de falar comigo mesmo, de analisar as próprias argumentações, de apimentar os atrativos dos causos que conto… E de morrer de rir da cara de espanto de quem me cerca.
Gosto de uivo de temporais, de esvoaçar de cortina de pano, de pancadas de mangas verdes caindo sobre telhados, de gemido de uma chuva chorosa sobre coberturas de palhas… E daquele cheirinho travoso de uma flor de caju.
Gosto que me enrosco de curvas femininas, do olhar insinuante da mulher que passa, do coaxar dos sapos que saúdam o anoitecer, do tilintar de folhas secas varrendo o asfalto… E do cantarolar de passarinhos que se aninham por entre os galhos de uma soturna jaqueira.
Gosto do encrespar das ondas do mar, do vaivém da espuma sobre a areia encharcada, do zunido de um vento gelado que me sopra aos ouvidos, do serpentear de um reflexo do sol que me coça os pés… E do bailado de uma lua azulada sobre as águas dos igapés.
Gosto da maciez da pele de uma delicada donzela, dos olhares fortuitos de uma mulher maliciosa, do brilho insinuante de uns olhos matreiros que me denunciam segredos… E do arrepio de uma voz rouca que me faz sonhar.
Gosto de sonho acordado, de beijo demorado, de carinhos ousados, do pulsar de um coração apaixonado, de desafios difíceis de serem realizados… E da conquista de troféus com os quais eu nem havia sonhado.
Gosto da madrugada, de uma noite enluarada, de manhãs ensolaradas, de fins de tardes amareladas, dos efeitos da brisa matinal sobre uma grama molhada… E do ressonar provocante de uma dama requintada.
Gosto de banhos de rio, de viajar de navio, de um lençol bem macio, de uma fêmea no cio a me acender o pavio… Gosto de viajar por um passado onde todas essas coisas não passavam de desafio.
Gosto da imponência de uma castanheira, do aroma gostoso de uma flor de goiabeira, dos requebrados de uma folha de bananeira… Da delicadeza da flor de urucum, da altivez do mandacaru… E dos narizes arrebitados daquelas mulheres do sul.
Gosto, enfim, de quem gosta de mim e procuro estar longe de quem quer ver o meu fim, pois os tombos da vida me fizeram assim. E assim vou juntando as minhas migalhas, tão feliz quanto nos tempos da cama de palhas, mantendo distância de quem só atrapalha… E me esquivando de agouros de rasga-mortalhas.
Silvio Cayua
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